domingo, 29 de março de 2009

A Dor do Abandono...

Era uma manhã de sol quente e céu azul quando o humilde caixão contendo um corpo sem vida foi baixado à sepultura. De quem se trata? Quase ninguém sabe.
Muita gente acompanhando o féretro? Não. Apenas umas poucas pessoas.
Ninguém chora. Ninguém sentirá a falta dela. Ninguém para dizer adeus ou até breve.
Logo depois que o corpo desocupou o quarto singelo do asilo, onde aquela mulher havia passado boa parte da sua vida, a moça responsável pela limpeza encontrou em uma gaveta ao lado da cama, algumas anotações. Eram anotações sobre a dor...
Sobre a dor que alguém sentiu por ter sido abandonada pela família num lar para idosos...
Talvez o sofrimento fosse muito maior, mas as palavras só permitem extravasar uma parte desse sentimento, grafado em algumas frases:
Onde andarão meus filhos? Aquelas crianças sorridentes que embalei em meu colo, alimentei com meu leite, cuidei com tanto desvelo, onde estarão?
Estarão tão ocupadas, talvez, que não possam me visitar, ao menos para dizer olá, mamãe? Ah! Se eles soubessem como é triste sentir a dor do abandono... A mais deprimente solidão...
Se ao menos eu pudesse andar... Mas dependo das mãos generosas dessas moças que me levam todos os dias para tomar sol no jardim... Jardim que já conheço como a palma da minha mão. Anos passam e meus filhos não entram por aquela porta, de braços abertos, para me envolver com carinho... Os dias passam... E com eles a esperança se vai...
No começo, a esperança me alimentava, ou eu a alimentava, não sei... Mas, agora... Como esquecer que fui esquecida?
Como engolir esse nó que teima em ficar em minha garganta, dia após dia?
Todas as lágrimas que chorei não foram suficientes para desfazê-lo.
Sinto que o crepúsculo desta existência se aproxima...
Queria saber dos meus filhos... Dos meus netos...
Será que ao menos se lembram de mim?
A esperança, agora, parece estar atrelada aos minutos... Que a arrastam sem misericórdia... Para longe de mim.
Às vezes, em meus sonhos, vejo um lindo jardim...
É um jardim diferente, que transcende os muros deste albergue e se abre em caminhos floridos que levam a outra realidade, onde braços afetuosos me esperam com amor e alegria...
Mas, quando eu acordo, é a minha realidade que eu vejo... Que eu vivo... Que eu sinto...
Um dia alguém me disse que a vida não se acaba num túmulo escuro e silencioso. E esse alguém voltou para provar isso, mesmo depois de ter sido crucificado e sepultado...
E essa é a única esperança que me resta... Sinto que há minha hora está chegando...
Depois que eu partir, gostaria que alguém encontrasse essas minhas anotações e as divulgasse.
E que elas pudessem tocar os corações dos filhos que internam seus pais em asilos, e jamais os visitam... Que eles possam saber um pouco sobre a dor de alguém que sente o que é ser abandonado...
A data assinalada ao final da última anotação foi à data em que aquela mãe, esquecida e só, partiu para outra realidade.
Talvez tenha seguido para aquele jardim dos seus sonhos, onde jovens afetuosos e gentis a conduzem pelos caminhos floridos, como filhos dedicados, diferentes daqueles que um dia ela embalou nos braços, enquanto estava na terra.

2 comentários:

  1. Amigo Wilson,
    me emocionei com essa história... mesmo! Já sou chorona por natureza, ainda encontrando algo assim tão emocionante, pornto!
    Quando passo em frente a asilos, sempre me pergunto como será que eles se sentem... o que já viveram nessa vida... o que ainda desejariam viver. Tenho vontade de conversar com eles, aprender com eles, mesmo que seja através de suas frustrações.
    Um beijo grande pra vc e tudo de bom... aos filhotes tb!

    Paz!
    Diana

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  2. Não deve ser fácil...
    Eu sempre tive muita vontade de ir à asilos e fazer um visitinha, mas infelizmente aqui no Japão eh muito burocrático o sistema para poder entrar.... Acredita nisso?!
    As pessoas internam seus pais e ainda proíbem a visita de estranhos...
    Parece que para entrar em um lugar desses sem ter parentes, é necessário pedir permissão a todas as famílias...
    Fico feliz por ter gostado da mensagem e ter deixado um recadinho.
    Beijos.

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